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quinta-feira, outubro 25

O último adeus

 O fim de tarde trouxe a calma de uma noite soalheira, encoberta pelos últimos raios de sol que se confundiam com o tom cinzento das poucas nuvens num céu outrora azul.
 Numa manta, de padrão axadrezada, ela aconchega-o nos seus braços, envolvendo-o com todo o seu carinho e afecto. Suavemente, as mãos deslizam umas nas outras, ele quase sem forças, para sentir o toque que desejou mais que tudo na vida poder sentir, olha o infinito do horizonte, perdido entre as ondas do mar e as gaivotas pousadas na areia branca da praia. Um sorriso, parecendo abraçar o mundo, coloca a lágrima num olhar pertencente a alguém, um olhar de quem nada mais pode oferecer.
 A penumbra da noite arrefece os corpos amados, o denso nevoeiro que se avizinha ao longe no mar ameaça acolher a praia em breves horas, o céu abriu caminho a algumas estrelas que rodeiam a lua brilhante e longínqua. Com a voz tremula sussurra algo a sua amada, um pedido ao alcance de uma pessoa capaz de amar, capaz de perceber e desculpar. Nas poucas forças que lhe restam, carrega sobre os ombros os sonhos que não realizou, um amor que não chegou ao fim, uma vida repleta de vazios preenchidos por uma só pessoa. Os seus passos lentos através da areia apenas são possíveis com a ajuda de uma guerreira na sua vida, alguém incapaz de desistir.
 As ondas desfazem-se mesmo ali, junto a eles, mas apenas a espuma consegue beijar-lhes os pés descalços, provocando um arrepio amenizado pela brisa quente que lhes percorre a pele. Ele perde-se, novamente, no horizonte das estrelas, ela tenta acompanhar esse olhar com a cabeça deitada no seu ombro, numa partilha de segredos silenciosa.
 Ambos sabem que o tempo é apenas uma questão tempo, uma vontade por cumprir, um sorriso por dar, memórias vagas que preenchem o vazio entre o passado e o momento exacto, apenas um amor por terminar.
- Não me deixes partir minha querida, segura-me pelo braço e faz com que o tempo pare aqui. Deixa-me ficar no nosso mundinho.
- Não te deixarei meu bem, por mais que o tempo corra, estarás sempre aqui!
 Os seus lábios brancos e gretados beijam-lhe a testa encoberta pela franja, de um cabelo castanho cor de mel, pedem-lhe desculpa de uma vida que a morte quis roubar, oferecem o nada que apenas consegue dar.

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